terça-feira, 3 de julho de 2012

O Cego



O cego olhou no seu espelho.

O que espero? Ver a mim como se fosse outro? Enxergar o que não quero ver? Ou simplesmente sorrir ao ver as expressões batidas e desgastadas que o meu amigo tempo me proporcionou?

Metade da vida já estava vencida e a outra metade, totalmente incerta se conseguiria batalhar contra os seus demônios e chegar até o outro lado do lago, que parecia muito distante.

O cego olhou os seus sapatos.

O que espero? Amarrar os meus cadarços como se os do outro fosse sem importância? Desconstruir o meu nó com apenas um dedo? Falar aos meus pés para se descalçarem sozinhos? Ou jogar fora o antigo par e sentir na pele o calor do meu deserto?

Encontrava-se sem lembranças, heranças ou herdeiros. Sem amor, outro olhar ou acompanhado. O que lhe restava além de se refletir?

O cego fitou sua janela.

O que espero? Pássaros alegres, um céu imensamente azul temperado com algumas nuvens brancas? Árvores cheias de vida, risadas inocentes de crianças, rios e lagos intactos? Ou simplesmente a realidade do cenário poluído, árvores mortas, choros extremos de crianças e rios e lagos poluídos?

Falava com sua solidão. Apertava a mão da sua tristeza. Abraçava com amor e carinho seu desespero.

O cego olhou o seu relógio.
Estava esperançoso pelo seu iminente fim. Estava bravo com o seu atraso.

O cego se foi. Não deixou inimigos, amigos ou amores. Simplesmente esperou chegar o final suspiro. Assim, o cego deixou de ver o que não precisava ver.

Agora há brilho em seus olhos.

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